Prólogo - ASCENDENTE

O céu da pequena cidade praiana estava sem nuvens naquela noite e Clara olhava atentamente a cada pontinho cintilante naquele mar de esc...

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• Dois • ASCENDENTE



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Um beijo ardente de repente

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Clara abriu o portão de madeira levantando a tramela em seguida fechando-o atrás de si, caminhou até a varanda da frente observando a lua reluzente no céu e lembrou-se de umas noites passadas a qual viu uma estrela cadente cruzar o mesmo céu. Várias coisas se passaram por sua mente, sobre seus planos para depois de terminar os estudos, onde iria trabalhar, se faria faculdade. Clara era uma moça sonhadora.

Tirando os sapatos do lado de fora e entrando sorrateiramente pela porta da frente, Clara caminhou no escuro até seu quarto com os sapatos nas mãos para não fazer barulho no assoalho de madeira. Precisava descansar para o dia que viria, mas não conseguia tirar o rapaz da cabeça. Estaria ela se apaixonando? Sua mãe jamais permitiria, seu pai então, até tinha um palpite do que ele falaria caso ela trouxesse o rapaz em casa agora: "você não pode namorar, pense no seu futuro primeiro, depois em rapazes"; e seu pai tinha razão, entrou no quarto fechando a porta e disse para si mesma "Foi só um beijo, Clara!". Pegou seus itens de higiene e foi até o banheiro, precisava tirar os vestígios da festa e depois de um banho relaxante, vestiu seu pijama favorito e sem acordar seus irmãos que dormiam no mesmo quarto entrou embaixo do lençol, mas não antes de conferir o cintilar das estrelas pela janela aberta sob o véu do mosqueteiro.


Os primeiros raios de sol já entravam pela janela quarto de Clara, sua mãe já tinha a chamado algumas vezes, sem sucesso. Decidiu se levantar da cama, tomar café e fazer o que sua mãe pedisse, para que depois do almoço daquele sábado ela pudesse sair com sua amiga para caminhar na praia e contar o que aconteceu com ela na noite anterior.

— Bom dia filha, como foi a festa, Clarinha? — sua mãe, Dona Maria, perguntou ao ouvir o ranger das tábuas do assoalho, ela estava no quartinho de costura ao lado da sala de televisão por onde Clara passou.

A moça queria contar tudo à sua mãe e confidente, mas omitiu a parte do rapaz que conheceu, tinha medo de descobrir que ele não era o tipo de genro que sua mãe sonhava em ter antes de poder conhecê-lo de verdade. Algo nele dizia que ele era perigoso, mas Clara não quis dar ouvido à sua intuição, ela tinha um certo apetite para coisas desse tipo, ou apenas fosse a idade. Aventureira, ela queria desbravar o mundo, mas se sentia um passarinho engaiolado por super proteção.

Dona Maria passou por muita coisa na vida, viveu no sítio, ajudou seus pais no engenho de açúcar e como filha mais velha de seis, ainda ajudava a cuidar dos irmãos mais novos e da casa. A vida não foi fácil e ela queria mostrar o valor do trabalho à seus filhos também.

— Que bom que se divertiu minha filha, agora tome seu café que preciso que você faça umas coisas para mim.

Clara assentiu e saiu sorridente pelo cômodo até chegar na cozinha com móveis simples muito bem feito pelo seu pai que era um carpinteiro de mão cheia e fez um ótimo acabamento nos cantos e com verniz escuro passou demãos do produto até ficar com as camadas uniformes.

Logo que Clara colocou os olhos na mesa posta sentiu a fome sonorizar, tinha pão e doce de banana feitos pela sua mãe. Serviu-se e pôs-se a comer pensando em como viveria sem essas delícias.

Antes de sair a moça arrumou a mesa e lavou a louça, sua mãe a orientou a deixar a casa sempre limpa e a louça lavada. E terminando tudo, ela saiu com a lista do que precisava comprar para a mãe preparar o almoço daquele sábado quente e ensolarado.

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Era quase meio dia quando Rodrigo conseguiu abrir os olhos, a ressaca não era forte, mas o incomodava. Pensou que ela não apareceria ou aquela erva que lhe deram não era tão boa assim.

— Acorda dorminhoco! — ouvindo isso ele sentiu uma pancada macia na cabeça, gemeu de dor e enfiou a cabeça embaixo do lençol, resmungando algo inaudível para Diego.

— Vamos mocinha — ele tentou novamente encorajar seu irmão — o sol está lindo e quem sabe poderemos ver as meninas de biquíni na praia!

Diego parecia animado naquela manhã, não tinha bebido muito e associado a uma boa noite de sono esse era o resultado. Outra almofadada em Rodrigo.

— Ok, ok, eu me rendo. — Rodrigo tirou a cabeça do lençol levantando as mãos em rendição, o jeito deles de irritar o outro.

Enquanto o irmão mais velho se vestia, ouviram uma buzina lá na frente, a carona para mais um final de semana de farra. Diego correu até a sacada da frente para sinalizar que estavam indo.

— Rápido mano, eles chegaram!

Desceram as escadas depressa, seus pais estavam viajando e não havia ninguém em casa e por isso aquele enorme sobrado vazio parecia deprimente. Suas irmãs mais velhas já tinham se casado e saíram de casa anos atrás para formarem suas próprias famílias, e só restaram os dois. Percorreram o longo caminho arborizado até o portão.

No carro estavam seus amigos de festa Henrique, o motorista do Chevrolet prata, um típico surfista alto, cabelos claros e pele avermelhada em alguns pontos mais expostos ao sol; Roberto, sentado no carona ao lado, cabelos curtos e escuros de pele morena, um perfeito descendente de índio; Luana, a loira de pele perfeitamente bronzeada sentada no carona de trás. A capota estava aberta então os meninos só pularam para dentro do veículo.

Durante o percurso o quinteto ouviu música alta e contaram suas histórias da noite anterior com muita risada e agito. Um tentando falar por cima do outro, tanta bagunça que o motorista quase perdeu o controle do carro em uma curva muito fechada. Luana, que ficou entre os irmãos no banco de trás, não perdeu a oportunidade de beijar Rodrigo tentando fazer ciúmes ao Diego.

Pegaram a rodovia em frente à casa dos rapazes passando pelo centro da cidade até o bairro Rosa, onde a praia era perfeita para o que eles tinham em mente e ficava na área sul da cidade.

Saindo da rodovia para a via lateral, passaram por baixo do viaduto para fazer o retorno e entraram em uma rua em frente que seguindo até o fim chegava na praia que era famosa entre os jovens que queriam privacidade, a longa faixa de areia era cercada de vegetação praiana e que não dava acesso à veículos, então teriam que estacionar o carro antes da vegetação e seguir a trilha a pé.

Naquele paraíso silencioso, as gêmeas Aurora e Pandora, aproveitavam o sol que queimava suas peles ao som das ondas do mar. Os biquínis minúsculos que usavam cobriam apenas o essencial, os cabelos loiros curtos e ondulados balançavam com a brisa do mar e um óculos escuro cobriam seus olhos verdes. Elas moravam ali perto e resolveram ir antes do horário combinado para aproveitar o melhor da praia sozinhas. De longe as moças ouviram seus amigos se aproximarem, tamanha era a bagunça e a altura do som.

Os rapazes descarregaram seus pertences do carro e não demoraram a montar uma tenda que protegeria eles e as bebidas do sol que não estava forte, mas esquentaria as bebidas rapidamente e acabaria com a festa. Trouxeram uma caixa com gelo e as bebidas, que ia de cerveja até destilados dos mais variados, era quase um bar móvel. Não podiam esquecer de cadeiras de praia e toalhas de banho, eles queriam curtir a praia vazia antes de beberem.

E assim foi até quase anoitecer, banho de mar, algazarra e muita bebida.

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Depois do almoço, Clara e Amélia saíram juntas para colocar o papo em dia. Escolheram caminhar até a praça no centro que era quase deserta nesse horário, a pé não era muito longe cortando algumas ruas. O lugar perfeito delas era a praia, mas era sábado e provavelmente teriam muitas pessoas aproveitando o dia de folga lá, e elas precisavam de privacidade.

Clara já não aguentava mais manter aquilo só para si e logo que estavam distantes de casa a moça contou tudo e com detalhes o que se passou desde que a amiga a deixou sozinha com aquele rapaz, que parecia muito afim dela, até elas se reencontrarem perto de casa. A história era instigante para Amélia, que esboçava diversas reações enquanto sua amiga lhe contava o episódio que passou.

— Acredita que eu não vi nadinha? — Amélia perguntou retoricamente, e logo explicou — porque eu conheci um rapaz também!

Clara não ficou chocada, mas descobriu com a amiga que ambos eram da mesma escola delas, mas de outro turno, e pelo que o rapaz disse eles eram irmãos.

— Não creio! — foi o que ela respondeu antes das amigas caírem na risada depois de se sentarem em um banco na praça mais afastado dos brinquedos onde as mães brincavam com seus filhos.

— Então as amigas beijaram os irmãos — Clara concluiu pensativa.

Pararam para observar as crianças se divertindo nos brinquedos, tinha escorregadores, balanços e uns de se pendurar, Clara relembrou quando era criança e sua mãe a trazia aqui para brincar com Amélia.

As amigas resolveram tomar um sorvete e molhar os pés na água salgada antes de voltarem, caminharam desde a praia central até a praia do Sul que era outro caminho para casa. Não tão longe avistaram um grupo de amigos bebendo e rindo alto e quando perceberam dois rapazes falando um com o outro e caminhando na direção delas.

"Rodrigo?" Clara pensou e analisou o rapaz ao lado dele, podia ser o irmão que a amiga falou.

— Diego! — Amélia fez o mesmo que a amiga e nenhuma das duas tinham aumentado ou diminuído o que disseram sobre eles.

— Oi meninas — os irmãos disseram em uníssono quando estavam a uma distância curta, estavam tão surpresos quanto as amigas, ainda mais que ambos estavam bêbados.

Quem diria, pensou Clara, e ela achando que jamais veria o rapaz novamente a julgar pelas suas companhias, sentiu uma ponta de ciúmes, e ainda de brinde é apresentada ao irmão de Rodrigo, que não tirou os olhos dela, que descarado!

Amélia sabia que uma hora ou outra poderia cruzar com Diego e até mesmo com Rodrigo pelas ruas da cidade, além de Pedra Grande não ser tão grande assim, eles moravam demasiadamente perto, elas na Praia do Sul, e eles na Praia do Norte, apenas separados pelo Bairro Centro.

— Interessante encontrar vocês por aqui — Clara observou o grupo atrás deles — mas precisamos mesmo ir para casa.

— É longe daqui? — Diego logo se prontificou, sempre cavalheiro.

As amigas gentilmente recusaram, por não quererem aparecer no portão de casa acompanhadas por dois rapazes, seus pais enlouqueceriam se vissem a cena. Eles logo entenderam e pediram pelo menos por um beijo, Rodrigo puxou gentilmente Clara pela mão até um deck na orla da praia a ergueu para se sentar no parapeito do deck, assim ela ficava um pouco mais alta que ele e a beijou profundamente segurando-a pela cintura para não cair, Diego fez o mesmo, mas foi para o outro lado da calçada de madeira, o beijo não foi como na noite passada, rápido e superficial, mas um beijo melhor, mais profundo, aquele que deixaria qualquer mulher suspirando.

Despediram-se delas e observaram as amigas caminhando através das longas sombras que se formavam na areia naquele fim de tarde.



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