Prólogo - ASCENDENTE

O céu da pequena cidade praiana estava sem nuvens naquela noite e Clara olhava atentamente a cada pontinho cintilante naquele mar de esc...

═══ • ◆ • ═══ Que você abra um lindo sorriso e sinta o meu amor aquecer seu coração. ═══ • ◆ • ═══ Clara se despediu da amiga assim que cheg...

• Seis • ASCENDENTE

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Que você abra um lindo sorriso e sinta o meu amor aquecer seu coração.

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Clara se despediu da amiga assim que chegou no seu portão, elas estavam com fome e o cheiro saboroso do feijão da Dona Maria fez o estômago das duas roncarem alto. Cada uma correu para a sua casa a fim de ajudarem suas mães a terminarem o preparo da refeição para enfim poderem se alimentar. Dona Maria policiava muito bem os horários dos filhos, e sabia que a filha estava atrasada para o almoço, será que estava com aquele rapaz, pensou. Até ouvir a porta da frente ranger com o movimento e a filha aparecer através dela.

— Se atrasou hoje, minha filha — Dona Maria observou, morava naquela mesma casa há anos e conhecia cada um dos visinhos e sabia quais tinham a língua solta e tentava desviar deles —, estou quase terminando, lave as mãos e se sirva, pois a Dona Cassilda precisa de verduras para o jantar e o senhor Olavo precisa de umas coisas da mercearia.

Clara assentiu e tratou de fazer o que a sua mãe lhe pediu, ela não falaria que o motivo do seu atraso era o rapaz por quem estava apaixonada e que ele estava a acompanhando até em casa. Por sinal, a moça precisava ocupar sua cabeça com coisas produtivas, antes que Rodrigo tomasse conta de todos os seus pensamentos.

Que a filha estava avoada, Dona Maria percebeu, mas arrancar algo da moça — a mais reservada das filhas — isso seria uma tarefa difícil. Já Flora era toda espaventada, falava o que queria mesmo quando não podia.

Nesse momento senhor Narciso chegou do trabalho, perto do meio dia, cumprimentou todos rapidamente, lavou as mãos no banheiro e sentou à mesa em silêncio e com a carranca de sempre, junto com os outros dois irmãos de Clara, Pedro, o mais novo e Flora.

Narciso estava sempre sério aparentando estar de mal humor e mesmo assim seus raros sorrisos eram verdadeiros. Ele amava sua primogênita, talvez mais que os outros dois filhos, mesmo sabendo que isso era errado. Talvez por esse motivo a conhecia muito bem e claro que ele não gostou de saber por sua mulher que um homem acompanhado de dois rapazes mais novos a buscou em casa para um jantar na casa deles, mesmo que a melhor amiga da filha tivesse ido junto. A por parte era um dos rapazes sendo intitulado como namorado de Clara. Dona Maria contou o que sabia do rapaz e seu ponto de vista a seu marido, falou dos detalhes sobre o jantar na casa dos pais dele, e que Amélia sempre a acompanhou, não deixando eles a sós para safadezas. Ele sentiu um demônio se enfurecer dentro de si, mas tratou de se acalmar e tirar essa história a limpo com ela quando tivesse a oportunidade. Não deixou de dar uma bronca em sua mulher por dar a ela essa liberdade tão cedo, mas Clara era nova de mais para as coisas do mundo que ele tanto tentava a proteger. Flora ouvia a conversa atrás da porta e sentiu uma ponta de inveja da irmã, pois ela não tinha essa atenção para si.

— Quem é o rapaz? — ele perguntou na mesa depois de todos terem se servido e começarem a comer, enfiou uma garfada na boca em seguida para dar espaço para a resposta. Essa era a tática dele e alguém teria de responder enquanto ele estava com a boca cheia, e se não tivesse resposta até ele engolir o último pedaço, a cinta ia esquentar. Todos sabiam que era de Rodrigo que Narciso perguntava, achavam que só porque ele estava trabalhando não iria descobrir? Pois seu pai ficou sabendo por Joaquim, seu amigo e vizinho e queria respostas, e os dois mais novos percebendo que Clara não ia responder, fizeram por ela para se livrarem do castigo.

— O namorado da Clara! — os dois disseram em uníssono e voltaram a seus respectivos pratos.

Narciso não falou nada, era seu jeito também, mas ninguém soube dizer se era bom ou ruim, então continuaram em quietos. Terminaram a refeição no mais pleno silêncio, apenas se ouvia o tilintar dos talheres no prato e o assovio dos pássaros nas árvores frutíferas no quintal, mas Clara bem sabia que essa reação do seu pai era de reprovação.

Assim como Clara, Amélia também ajudou sua mãe a terminar o almoço. Dona Tereza percebeu sua filha mais animada e concluiu que precisava ter uma conversa franca com a moça.

— E esse rapaz, Mel? Irmão do tal Rodrigo, Diego o nome dele? — sua mãe pergunta como quem não quer nada — Ele parece ser um rapaz bom, o pai deles me deu uma boa impressão.

Amélia pensou antes de falar, ela se surpreendeu com a observação da mãe, ela não imaginava que ela estivesse pensando em algo assim.

— Ele é um cara legal, mãe — Amélia começou devagar. Passou pela sua cabeça que algum vizinho tivesse visto os dois e a dedurado para sua mãe quando ela não estava em casa, então pensou com cautela antes de responder.

— Que bom filha que se dão bem, quem sabe vocês ficam juntos também — Dona Tereza aconselhou sua filha, por fim — eu aprovaria.

Amélia sorri para a mãe que devolve com um olhar cúmplice, ela estava feliz que acertou seus pensamentos sobre a filha. Dona Tereza não sabia que a moça já havia trocado beijos com o cunhado da melhor amiga, mas esse era um detalhe que ela não precisava saber agora.

Seu Joaquim chegou em casa do trabalho nesse momento, e depois de cumprimentar sua filha mais nova e sua mulher, todos sentaram à mesa para almoçar, sua irmã mais velha estava no trabalho extra e sempre almoçava lá.

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Quando o relógio apontou ser duas da tarde Clara chamou pela amiga no portão, era hora delas fazerem suas atividades. Amélia levantou do sofá sonolenta, a tábua onde ela pisou para se equilibrar rangeu com o peso, caminhou preguiçosamente até a janela para chamar sua amiga para entrar.

Amélia puxou a amiga para seu quarto, não era porque iam sair às compras para seus vizinhos ali perto que precisavam sair desleixadas. Elas pentearam seus cabelos e amarraram de um jeito charmoso, ambas com cabelos compridos soltos nesse calor não combinava e pigmentaram os lábios. Depois de estarem com menos cara de "acabei de acordar de um cochilo", elas pegaram as sacolas de pano que suas mães fizeram e foram primeiro na casa de Dona Cassilda e depois na casa do Senhor Olavo, anotando em um bloco de papel o que ambos precisavam, saindo em seguida.

Entrando na verdureira do Sr. Manoel elas cumprimentaram o dono, que atendida um cliente no caixa. A Verdureira do Seu Manoel não era muito grande, mas era a mais perto de suas casas e os preços eram os melhores.

— Esses legumes são para a Dona Cassilda? — ele pergunta se aproximando das moças, ele bem sabia a resposta, pois elas estavam escolhendo os legumes mais maduros, que era como Dona Cassilda preferia e descartando as verdes.

— Sim, senhor Manoel — Amélia respondeu com um sorriso e malícia no olhar.

— Separei umas mais maduras do jeito que ela gosta, deixa eu pegar lá trás para vocês — Seu Manoel deu as costas para as moças antes que elas vissem suas bochechas rosadas, envergonhado. As amigas se entre olharam tentando conter os risinhos de "te peguei no flagra!".

Não demorou a voltar com os legumes especificados na lista da velha senhora, bem maduros e suculentos. Recebeu o valor — com desconto por estarem muito maduras — e ofereceu uma fruta a escolha das meninas por pagamento do seu silêncio. Ele queria que essa paixão platônica continuasse no anonimato e por isso fazia isso.

— Sabe que precisa se declarar um dia, não é seu Manoel?

— Eu sei pequenas, quem sabe um dia. — Repetiu ele com o olhar longe. — Quem sabe um dia.

As amigas agradeceram a gentileza e saíram radiantes pelas ruas em direção à Mercearia da Família enquanto degustavam seus morangos doces e avermelhados. Lá comprariam o que estava na lista do Sr. Olavo. Vários enlatados e conservas, normal para um senhor aposentado e viúvo que morava sozinho.

Entregaram as compras do Senhor Olavo primeiro, pois ficava mais distante da casa das amigas do que a casa de Doma Cassilda, que ficava a três postes de distância. Ele atendeu na primeira chamada, abriu o portão e as acompanhou até a cozinha, onde elas esvaziaram as sacolas de estampa de frutas guardando as compras no armário embaixo da cristaleira. Elas receberam a suas gorjetas, se despediram do senhor e com a outra sacola de Dona Cassilda de estampas de flores elas caminharam até a casa da senhora.

Amélia cansou de bater palmas, enquanto Clara cansou de chamar por Dona Cassilda no portão, então as amigas desistiram e concordaram de voltarem mais tarde e depois de darem as costas a velha senhora aparece na janela chamando por elas.

— Mil perdões garotas — Dona Cassilda dizia enquanto corria abrir o portão e as convidou para um café fresco passado no coador novo que sua filha havia lhe dado — eu acabei esquecendo que havia pedido para vocês irem na verdureira e fui tirar um cochilo.

As amigas responderam que não precisava se desculpar, que elas entendiam e não ficaram chateadas e era verdade, elas faziam isso porque gostavam deles e queriam ser úteis.

O café ficou pronto e Clara colocou as bolachas na mesa, enquanto Amélia distribuía as xícaras. E logo se serviram de um café delicioso, passavam das quatro horas da tarde, e a fome já estava estampada na face das amigas.

Depois de terminar o café, as meninas tinham outra tarefa, lavar a louça e descascar e picar os legumes. Enquanto isso, tinham uma conversa harmoniosa com a velha senhora sobre os trabalhos na sorveteria e os clientes que atenderam. Dona Cassilda foi vendedora quando mais jovem, e antes das meninas irem embora ela deu dicas para cativar os clientes. Agradecendo as dicas, as amigas se despediram da vizinha, e logo depois elas mesmo se despediram no portão, já estava escurecendo na pequena cidade.

Os olhos de Clara cintilaram ao contar todo o seu dinheiro junto, contando com o que havia ganho hoje, a quantia não era muita, mas ajudaria a pagar uma parte da sua festa de quinze anos, que seria na metade do próximo ano, e ainda sobraria para outro fim do seu agrado.

Amélia não sabia ao certo o que fazer com o dinheiro guardado ainda, ela portanto não queria festa de aniversário, então apenas guardou seu dinheiro até valer a pena depositar em um poupança.



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